Andarilhos e andrajosos

 A sociedade humana é um grande laboratório a céu aberto para quem estuda, observa e analisa como funcionam as pessoas e tudo a ela inerente e à sua volta. Mas, pensar é para poucas pessoas, porque muitas são as coisas e funções que já estão prontas. E nem se fala de tudo quanto for material, instrumental, sistemas, equipamentos. A questão maior aqui é as relações humanas entre os próprios humanos, objetais, com o meio circundante, com todos os seres materiais, minerais, vegetais e animais que nos dizem respeito. Mas, aos exemplos, o que mais a todos interessa.

Andava eu por um bosque e deparou-me algumas cenas que valem o registro. Dois ou três andarilhos em vestes andrajosas, molambentas circulam por esse bosque, como morador desse bosque. Cada qual em repulsivas condições de higiene e saúde. Informando-me sobre as condições desses humanos, disseram-me comerciantes permissionários desse mesmo bosque que eles aí vivem, sem nenhum amparo dos agentes públicos, prefeitura, secretaria de assistência social, algum asilo ou entidade que o valha.

Esse bosque, uma reserva nativa, com plantas regionais e originais, intocáveis, abriga um museu de artes e cursos artísticos, uma assembleia legislativa do Estado, e ao lado, a cerca de 30 metros, o tribunal de justiça do Estado. Existe a Associação dos Amigos do Bosque (AMB), constituída de pessoas intituladas “amigos do bosque” e da natureza.

Quem percorre e passeia por essa reserva natural, equivalente a 3 campos de futebol, se vê na oportunidade de contemplar, admirar e se alegrar com muitos encantos nativos. São lagos e cascatas de água corrente e límpida, vegetação de diversidade botânica, árvores frutíferas, floridas e verdejantes, com um agradável e refrigerante microclima. Além de riqueza floral, uma fauna de peixes e animais aquáticos, saguis, aves e pássaros canoros e exposições de artes no museu localizado no interior do bosque.

Algumas cenas que merecem análises de pessoas pensantes, pesquisadores, psicólogos e psiquiatras; além de antropólogos e sociólogos são essas a seguir. Dezenas de transeuntes e passeadores e exercitadores das pistas de caminhadas do interior do bosque levam, diariamente os seus pets, os intitulados animais de estimação (rótulos e eufemismos criados pela sociedade humana). Referidos animais, de fato, se mostram soltos ou em coleiras, muito bem cuidados e higienizados, às vezes com indumentárias estilizadas para animais. São animais em estágios evolutivos antropomorfizados, muitos com direitos e tratamento de dar uma santa inveja em alguns humanos desumanizados, a exemplos desses invisíveis e maltrapilhos habitantes humanos do bosque.

O que se pretende com essa sumária resenha, é esse registro. As cenas podem ser assim delineadas. Existe um parque natural, um bosque de fauna e flora nativa frequentado por muitos humanos e fiscalizado por vários humanos auto intitulados amigos do bosque e da natureza. Muitos dos quais cuidam zelosa e luxuosamente, fraternal e paternalmente de seus pets (“deixe a mamãe dar águainha; vem cá com papai”). Há os passeios diários com seus bichinhos, que, às vezes, deixam seus excrementos para contaminar os mananciais naturais e passeios de todos etc., etc.; Todos os dias ao lado, atrás e em frente, os frequentadores bem trajados, veem esses maltrapilhos, abandonados trapos humanos. Todos esses passantes e caminhantes continuam indiferentes a esses maiores abandonados, repulsivos e fétidos moradores do bosque. Esse ciclo se passa em todas as datas, natal, ano novo, carnaval, páscoa. Passagem, páscoa, natal e ano novo. Indiferentemente.

 Nesse bosque vicejam sementes, somente sementes vegetais; disso não se mente, diz-se assim, de forma inclemente. Ao que parece na sociedade humana maior, muitos são os dementes, abandonados por pessoas que cuidam tão bem de seus semoventes, e abandonam os de mesma espécie de forma inclemente.

 

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